no dia em que acertei uma mosca pousada nos meus joelhos
os ossos se retiraram do meu corpo
e virei um molusco
amarelo larva
a luz do teto se confundiu com a luz do fogo
não havia matado uma mosca
mas aquela
que pousara as suas patas nas minhas
é assim que
os encontros ficam espessos demais
coalham
e resolvem virar mundo
sexta-feira, 19 de julho de 2019
quinta-feira, 18 de julho de 2019
posso respirar
crianças constroem seus vulcões
não há quem duvide da piracema
as coisas crescem
quando precisam mudar de cor
agora que os macacos cantam intensa e fixamente sobre as árvores,
posso existir do tamanho de um alvéolo pulmonar
posso nascer um pouco menor, caber com as coisas
posso soprar desde dentro uma água nascente
mesmo não sendo quem sopra
mesmo não sendo exatamente a força que resiste à cachoeira
mesmo não sendo a cor que fez o dia brotar
posso respirar
e é imenso
não há quem duvide da piracema
as coisas crescem
quando precisam mudar de cor
agora que os macacos cantam intensa e fixamente sobre as árvores,
posso existir do tamanho de um alvéolo pulmonar
posso nascer um pouco menor, caber com as coisas
posso soprar desde dentro uma água nascente
mesmo não sendo quem sopra
mesmo não sendo exatamente a força que resiste à cachoeira
mesmo não sendo a cor que fez o dia brotar
posso respirar
e é imenso
quarta-feira, 17 de julho de 2019
torrente em tudo
quando, finalmente,
a palavra retornava ao oco
as estantes ficavam vazias
e o silêncio das águas se afastava da morte,
eu permanecia condenada ao desvínculo.
quando, o cheiro da carne momentânea
se atolava de repetição em repetição,
eu pensava:
eu não teria te amado se não fosse esse finalmente
se finalmente não fosse
essa condenação entre
entrar e não entrar no oco gelado da presença
e colher do frio nem bem nem mal
mas a razão de existir de uma colheita:
é sempre a si mesmo o que se entrega
momentânea, original, torrente em tudo
a palavra retornava ao oco
as estantes ficavam vazias
e o silêncio das águas se afastava da morte,
eu permanecia condenada ao desvínculo.
quando, o cheiro da carne momentânea
se atolava de repetição em repetição,
eu pensava:
eu não teria te amado se não fosse esse finalmente
se finalmente não fosse
essa condenação entre
entrar e não entrar no oco gelado da presença
e colher do frio nem bem nem mal
mas a razão de existir de uma colheita:
é sempre a si mesmo o que se entrega
momentânea, original, torrente em tudo
domingo, 7 de julho de 2019
domingo, 28 de abril de 2019
um homem carrega balões para dentro do parque
me coloca em perigo
um outro carrega uma sacola plástica com uma orquídea roxa envolta em plástico, num vaso de plástico
me coloca em perigo
uma senhora senta-se no ponto de táxi para descansar de costas para os carros, coloca sua sacola de nylon limão no meio da passagem
me coloca em perigo
porque hoje é sábado
penso e isso
me coloca em perigo
carrego um maço de trigo para enfeitar um vaso que não tenho, passo em frente à padaria
decido não comer um pãozinho
parar na rua com trigo nas mãos em frente a uma padaria me parece bonito
quinta-feira, 11 de abril de 2019
segunda-feira, 1 de abril de 2019
Tem de haver mais
Agora o verão se foi
E poderia nunca ter vindo.
No sol está quente.
Mas tem de haver mais.
Tudo aconteceu,
Tudo caiu em minhas mãos
Como uma folha de cinco pontas,
Mas tem de haver mais.
Nada de mau se perdeu,
Nada de bom foi em vão,
Uma luz clara ilumina tudo,
Mas tem de haver mais.
A vida me recolheu
À segurança de suas asas,
Minha sorte nunca falhou,
Mas tem de haver mais.
Nem uma folha queimada,
Nem um graveto partido,
Claro como um vidro é o dia,
Mas tem de haver mais.
Arseny Alexandrovich Tarkovsky
E poderia nunca ter vindo.
No sol está quente.
Mas tem de haver mais.
Tudo aconteceu,
Tudo caiu em minhas mãos
Como uma folha de cinco pontas,
Mas tem de haver mais.
Nada de mau se perdeu,
Nada de bom foi em vão,
Uma luz clara ilumina tudo,
Mas tem de haver mais.
A vida me recolheu
À segurança de suas asas,
Minha sorte nunca falhou,
Mas tem de haver mais.
Nem uma folha queimada,
Nem um graveto partido,
Claro como um vidro é o dia,
Mas tem de haver mais.
Arseny Alexandrovich Tarkovsky
eu vi você acordada no meio de um sonho
eu vi você tentando diminuir a distância entre um fruto maduro e a semente
eu vi você desenhando um rio dentro de uma gota de água
eu vi você chorar porque alguém está prestes a amar
mas,
tente não morrer por hoje
tente não morrer
tente, por hoje, não morrer
ainda
que o único compromisso seja
desafiar um pouco a morte
tente, hoje,
não morrer
a morte que não se completa.
terça-feira, 26 de fevereiro de 2019
Carta aos sobreviventes
Naquele dia eu estava com uma pele de pera. Daquelas finas, que se machucam com qualquer quina. Aliás, toda pera é uma quina, parece estar sempre querendo um toque.
Sendo mais precisa, eu trazia a grade da fruteira do mundo que passou a noite inteira a entrar na minha carne, fazendo um corte profundo, eu estava lutando pra escurecer e estancá-la.
Trabalhava na pintura do corte, apagava a luz da ferida para ela adormecer e esperar o tempo da cura.
É incrível como as peras são eróticas quando estão sem pele. Mas naquele dia sim, eu tinha uma pele.
Você já reparou como uma pera inteira sem a casca é pornográfica? Uma pera inteira sem casca é o homem nu, deitado na cama com a sua puta, permitido de fragilidade.
Você me falava de como os homens são frágeis quando mordem o fruto. Querem apenas se encolher e acabam escorrendo. Se os homens soubessem como eles escorrem no amor, jamais o fariam de novo.
Foi por esse corte que eu vi o outro lado da pera. Foi por esse corte que eu vi o outro lado da nudez. Eu vi uma palavra rombo, uma palavra intervalo. E é assustador, não tem grade alguma. Por isso eu preciso me agarrar onde termina e onde começa algo. Eu tenho um pouco de medo de não saber reconhecer a fruta.
Como sobreviver a mordida? E, se sobrevivo, sobrevivo em relação a quê?
Posso dizer que um pé sobreviveu em relação ao corte? E o corte? Sobreviveu a quê? O corte simplesmente desaparece? Pra onde ele continua? Como continuar depois da poda?
Às vezes acho que sobreviver é a certeza da morte. É suspender a luta. Nada mais desnecessário do que lutar contra a morte, ela ganha melhor.
Às vezes penso que sobreviver é a morte esticada, estirada ao chão, é fazer coincidir a sua sombra com a sombra das palavras.
Mas, se nos amamos, é por falha. É por falhar a morte. É por falhar a palavra.
Se nos amamos, é porque farfalha. É porque ainda há tempo de retirar os lençóis brancos do armário.
segunda-feira, 14 de janeiro de 2019
segunda-feira, 7 de janeiro de 2019
terça-feira, 1 de janeiro de 2019
dizem
que aquilo que fazemos no primeiro dia do ano
é muito importante
uma vez que será repetido ao longo de todos os dias
o que fazemos no primeiro dia do ano
conta muito
por exemplo,
agora tenho os pés frios
e, geralmente, quando tenho os pés assim
eu não consigo dormir
ou pensar em outra coisa
a não ser que eles estão frios
como se estivessem
separados
do resto do corpo
na verdade,
nem pensar eu consigo
nem ficar com o resto do corpo
meu irmão tem os pés assim
frios
permanentemente
inclusive no calor e de meias
quem me contou foi a mãe
ele mesmo nunca me disse
deve ser isso
que é preciso
fazer no começo do ano
por exemplo
que aquilo que fazemos no primeiro dia do ano
é muito importante
uma vez que será repetido ao longo de todos os dias
o que fazemos no primeiro dia do ano
conta muito
por exemplo,
agora tenho os pés frios
e, geralmente, quando tenho os pés assim
eu não consigo dormir
ou pensar em outra coisa
a não ser que eles estão frios
como se estivessem
separados
do resto do corpo
na verdade,
nem pensar eu consigo
nem ficar com o resto do corpo
meu irmão tem os pés assim
frios
permanentemente
inclusive no calor e de meias
quem me contou foi a mãe
ele mesmo nunca me disse
deve ser isso
que é preciso
fazer no começo do ano
por exemplo
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